sábado, 11 de maio de 2013

No coração de Lages, o lado do morro que quase ninguém vê


No coração de Lages, o lado do morro que quase ninguém vê
Lages, 11 e 12/05/2013, Correio Lageano, por Adecir Morais



A exploração comercial legal e ilegal de minerais, construções irregulares e plantação de pinus estão mudando a paisagem e devastando o Morro Grande, um dos pontos mais tradicionais da cidade.



O silêncio da natureza é quebrado pelo barulho de máquinas que perfuram o solo para extrair pedras. Ruas foram abertas e o vai e vem de caminhões pesados, que transportam a matéria-prima é intenso. E o verde da mata nativa, como era antes, quase não existe mais. É uma verdadeira zona industrial atrás do Morro Grande, em Lages, escondida de praticamente todos os lageanos.



Com aproximadamente um milhão de metros quadrados, o morro vem se transformando aos poucos. A exploração mineral, que hoje ocorre de forma legal e ilegal, avança. A extração de pedra basalto, feita por uma empresa legalizada, já atingiu cerca de 80 mil metros quadrados e avança rumo à cruz. De lá, toneladas de pedra saem diariamente para abastecer a indústria.



O processo de extração de minério iniciou há décadas. Por causa de irregularidades, a atividade ficou parada por um longo período, mas retornou a todo vapor há mais de um ano. Hoje, é possível ver o corte da rocha avançando morro adentro, como se fosse atravessar de um lado para outro. Imagens aéreas comprovam o estrago.



O morro também virou um vasto tapete verde para quem olha de cima, com o avanço da plantação de pinus, que ocupa praticamente toda a extensão do local. De lá, nos próximos anos, sairá um grande volume de madeira para a indústria, mudando ainda mais a paisagem já ofuscada.



Fora a extração legal de pedra e a plantação de pinus, ainda há local uma pedreira clandestina, de onde famílias retiram, manualmente, material para a construção civil. O impacto visual da atividade pode ser observado de longe. Além do dano ambiental, os trabalhadores não usam nenhum tipo de material de proteção.



No morro, também existe uma usina de reciclagem de lixo da construção civil, onde são manipuladas toneladas de detritos, como tijolos, madeiras, entre outros. O empreendimento está em operação há mais de dois anos.



O aposentado Vivaldino Antunes da Silva, de 69 anos, foi um dos primeiros moradores da encosta do morro. Morador no bairro Bom Jesus, cerca de 500 metros longe da pedreira, diz estar abismado com o aumento das crateras. “Estão destruindo mesmo. Se continuar assim, vão acabar com tudo”, denuncia.



Quem também mora no Bom Jesus, aproximadamente 400 metros de distância da pedreira, é o aposentado Antônio Lemos Ribeiro, de 76 anos, destes, 13 morando no local. Ao contrário do colega Vivaldino, ele é mais otimista. “O morro está firme e acho não vai acabar tão cedo”, opina. A entrada do Correio Lageano no local não foi permitida.



O gerente regional da Fundação do Meio Ambiente (Fatma), Willy Brun, esclarece que a empresa que explora a pedreira está com todas as licenças ambientais em dia. “O empreendimento cumpre todas partes de proteção ambiental”, afirma, explicando que, em relação ao uso do solo, cabe a prefeitura fiscalizar.



Quanto à pedreira clandestina, Brun promete agir. “Vamos visitar a área, autuar os responsáveis e até embargar a atividade. O problema é que nem sempre os fiscais encontram os trabalhadores, o que prejudica nosso trabalho”, diz.



Geóloga diz que maior problema é a ocupação



A geóloga e professora do Centro de Ciência Agroveterinárias de Lages (CAV), Raquel Valério de Sousa, explica que a exploração de minérios traz danos ao meio ambiente, mas que as mineradoras são licenciadas e dispõem de plano de recuperação da área.
Segundo ela, é “óbvio que o dano existe, mas os recursos têm que ser explorados de forma racional para preservar os recursos naturais, com sustentabilidade, olhando o aspecto social, ambiental e econômico”.


Lembra que, no caso da pedreira do Morro Grande, o empreendimento funciona de forma legal. Para operar legal, a mineradora precisa ter autorização do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), que emite a portaria de lavra, além de licença ambiental da Fatma.


O plano de recuperação da área prevê ações como o retaludamento (estrutura de contenção) e recomposição da área pelo empreendimento, dentre outras ações.
“Temos que deixar claro que a mineradora está dentro da lei”, diz a geóloga, destacando que o maior problema é a ocupação habitacional irregular. O governo deveria implementar ações para melhor regularizar o uso e a ocupação do solo para evitar o avanço de ocupação irregular nestas áreas de risco.



Fendas se abrem no solo, dizem os parapentistas



O Morro Grande é hoje, considerado um dos principais pontos turísticos de Lages. Todos os anos, milhares de pessoas visitam o local, sobretudo nas sextas-feiras santas, quando sobem os mais de 500 degraus de escadaria para ver a encenação e morte de Jesus Cristo.



O local também é usado por desportivas que praticam parapente. Os aventureiros utilizam o local para saltar e, do alto, apreciar a cidade.  Aliás, alguns denunciam que no local já é possível ver fendas de cerca de um metro de largura no meio da plantação de pinus, evidenciando o estrago ambiental. “A situação é preocupante”, dizem.



Prefeitura promete rigor na liberação de licenças para novos empreendimentos



O secretário de Meio Ambiente, Mushue Hampel, diz que a prefeitura também vê com preocupação a transformação do morro. Segundo ele, de agora em diante o município vai tomar medidas mais rigorosas quanto à emissão de licenças para futuros empreendimentos no local.



Do ponto de vista social, destaca que um dos problemas verificados se refere ao processo de escoamento da pedra extraída na mineradora. Atualmente, os caminhões carregados passam entre as casas do bairro Bom Jesus, provocando transtornos aos moradores, como poeira em excesso e rachaduras nas residências devido ao peso das cargas.



Já em relação à ocupação habitacional do morro, admite que há muitas residências em área de risco, mas adianta que a prefeitura está estudando um plano para realocar as famílias que lá estão.




Foto: José Rabelo/Divulgação

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