terça-feira, 16 de abril de 2013

Comunidade se revolta com a demolição de casas no interior do Cerrito



Comunidade se revolta com a demolição de casas no interior do Cerrito
São José do Cerrito, 17/04/2013, Correio Lageano, por Suzani Rovaris


Parte da localidade Canoas fica no entorno da construção de uma hidrelétrica. Moradores que residem da área de acesso terão que sair, mas alegam que ação de empresa não deu tempo para eles se organizarem.



A destruição de casa na localidade Canoas, interior do município de São José do Cerrito, está provocando revolta entre os moradores que ali têm residência. Algumas propriedades serão afetadas pela Usina Hidrelétrica Garibaldi.




No período de uma semana, o casal Roni Corrêa Ramos, de 61 anos, e Idelma de Souza Ramos, 61 anos, trocou o conforto de sua casa para viver em um galpão. Esta não foi uma escolha deles, a casa onde moravam foi demolida na quarta-feira, dia 10, pois integra o grupo de propriedades atingidas.


Empresa se pronunciará hoje



O local onde Roni e Idelma moram era usado para guardar as máquinas agrícolas, que agora ficam na rua. A nova moradia não tem divisórias, os móveis foram dispostos conforme o espaço estabelecido pelo casal. O cheiro dentro da casa é de animais, pois ao lado é onde ficam os porcos e o gado.



No mesmo terreno havia mais duas casas que também foram demolidas, em uma delas morava a filha Inocência Pinho Corrêa. Atualmente, ela mora com parentes. Roni e Idelma nasceram na região e vivem no local há 33 anos. Segundo o casal, o terreno foi comprado por cerca de R$ 400 mil, mas receberam da empresa Rio Canoas Energia S.A., o valor de R$ 150.400,00.



A Usina Hidrelétrica Garibaldi começou a ser erguida em abril de 2010. Vai atingir os municípios de Abdon Batista, Cerro Negro, Campo Belo do Sul, São José do Cerrito e Vargem. O investimento é de cerca de R$ 950 milhões. Aproximadamente, 540 famílias são afetadas no entorno da obra.



Na localidade de Canoas, interior de São José do Cerrito, 22 propriedades estão entre os terrenos atingidos.  Neles moram de uma a quatro famílias. Algumas são proprietárias, outras arrendatárias. Os moradores dizem que os arrendatários vão receber uma carta de crédito e os donos de terra vão receber, inicialmente, o valor do terreno e, depois, as benfeitorias. Um dos problemas abordados pelos proprietários é que o valor pago pelos terrenos é muito baixo.



Dois proprietários, Maria Tereza da Silva Corrêa e Eden Socrepa, possuem um terreno cada um, de pouco menos de um hectare. Eles afirmam que receberam cerca de R$ 1 mil pela área. Segundo informa a prefeitura de São José do Cerrito, o valor do hectare na região de Canoas vale em torno de R$ 4,2 mil.



Moradores preocupados


Sobre o pagamento das benfeitorias, os moradores dizem que a empresa não vai pagar pelo que existe em cima da terra. E esses, como afirmam, nem são os principais motivos para tirar o sono de quem mora na região. Eles contam que estão com medo da empresa demolir as casas sem dar prazo suficiente para encontrarem outro local.



O casal Roni e Idelma afirma que nunca recebeu notificação para sair de casa. Segundo Roni, um oficial de justiça foi quem os avisou para desocuparem a residência. Cinco dias depois, representantes da empresa e 10 policiais apareceram na propriedade para desmancharem as casas. “Nunca pensei que veria uma cena como aquela. Construí as casas com o esforço do meu trabalho e no dia não pude fazer nada, a não ser sentar do barranco e olhar”, comenta Roni.



Alguns moradores afirmam que as notificações para desocuparem as residências estão sendo entregue há cerca de 20 dias. Todos os moradores afetados são agricultores, o que representa que precisarão começar suas plantações do zero.



  •  Paulo Sérgio da Silva tem quatro propriedades que ficam à beira do rio e serão atingidas. Ele recebeu pelos quatro terrenos o valor de R$ 100 mil. Segundo ele, a empresa se comprometeu em lhe fornecer um documento para garantir o pagamento das benfeitorias, mas até agora não recebeu. “Eu agendo um horário para ir até a empresa pegar o documento, mas os funcionários afirmam que estão ocupados e não podem me atender Já fui várias vezes, mas nunca fui atendido”, diz. Em um dos terrenos há plantação de alfafa e milho e ele estima que toda a lavoura será perdida. Ele possui ainda uma residência mista e dois galpões. Além disso, Paulo possui um armazém e afirma que muitos moradores ficaram com medo de suas casas serem demolidas e se mudaram para municípios vizinhos e, por isso, o número de clientes reduziu, assim como o lucro, de R$ 12 mil passou para R$ 6 mil por mês.



  •  O agricultor José Godóy, de 89 anos, mora com a filha Salete Antunes Godóy, à beira da BR-282. Ele recebeu R$ 100 mil pelo terreno, que conforme diz, vale mais que R$ 200 mil. Há algumas semanas, José conta que representantes da empresa Rio Canoas queriam transferi-lo para um local afastado da rodovia, mas o agricultor tem problema de saúde e disse que prefere morar à beira da BR-282, pois é mais rápido para ser atendido. José é remanescente, ou seja, parte de seu terreno não vai ser atingido e, por isso, é onde vai construir a casa. Ele conta que vai perder galpão, estrebaria e a lavou de milho e feijão.



  •  A empregada Adriana Vitor de Oliveira é uma das pessoas arrendatárias. Ela mora em uma das propriedades de Paulo Sérgio da Silva. Ela já recebeu a notificação para sair de casa, mas ainda não recebeu a carta de crédito e afirma que a empresa se comprometeu em lhe dar um terreno na localidade de Laranjeiras, interior de São José do Cerrito.



Sem rumo


Moradores abaixo não receberam a carta de crédito e afirmam que precisam desocupar suas casas
• José Sirineu Borges e a mulher Sirlene Vitor de Oliveira nasceram na região e agora estão morando com a mãe de José.
• Ademir Machado e Elizangela Vitor de Oliveira, a família tem quatro filhos e não têm para onde ir.
• Adelir Onéris Ortiz, na última semana, voltou a morar em Lages.
• Rudnei Araújo e a mulher, tem dois filhos e não encontraram local para morar



O que diz o Ministério Público


A Promotoria do Meio Ambiente é um dos órgãos estaduais que participaram da negociação entre os moradores do Canoas e empresa. Segundo o promotor Renee Cardoso Braga, o valor pago para os moradores é referente ao terreno e as benfeitorias.



Ele explica que a empresa não paga por benfeitoria considerada “de má-fé”, referente as construções sem utilidade erguidas para aumentar artificialmente o valor da propriedade.
Sobre as reclamações de valores abaixos do que os moradores esperavam, e inclusive o exemplo citado de que alguns receberam de R$ 1 mil por suas propriedades, o promotor afirma que a informação não procede e complementa que desconhece o caso de algum morador receber preços tão baixos. Pelo contrário, ressalta, os valores são bem positivos.



Em relação às notificações, o promotor diz que é solicitado ao morador sair de sua residência somente depois que o valor é pago e que os arrendatários recebem as cartas de crédito conforme é avaliado cada caso. De acordo com Braga, a promotoria tem recebido diversas reclamações sobre as cartas de crédito negadas para alguns arrendatários.




Empresa se pronunciará nesta quarta-feira (17)



A reportagem do Correio Lageano esteve em contato com a Triunfo Rio Canoas desde as 9h30min de ontem para ouvir a versão da empresa. No primeiro contato, a assessoria informou que teria resposta no começo da tarde. Foram feitos novos contatos às 13h, às 15h, às 16h45min, às 17h. Neste último, a empresa pediu as perguntas por e-mail e prometeu as respostas até as 18h. Foram enviadas seis perguntas, mas até o horário combinado não havia respostas.



Pouco depois das 18h30min, a assessoria da Triunfo Rio Canoas enviou e-mail à redação do jornal considerando que, por se tratar de um processo complexo, que envolve muitas particularidades e informações técnicas, a melhor forma de esclarecer todas as dúvidas seria por meio de uma entrevista. A empresa ficou de entrar em contato com a redação do Correio Lageano hoje.



Fotos: Suzani Rovaris

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